O Testamento espiritual de Papa Francisco

O Testamento espiritual de Papa Francisco

Com a morte do Papa Francisco, em 21 de abril de 2025, o mundo inteiro pode logo em seguida tomar conhecimento do seu Testamento.

Uma coisa que muito me marcou do Testamento do Papa Francisco, com assinatura de 29 de junho de 2022, foi isto: “Que o Senhor dê a merecida recompensa àqueles que me quiseram bem e que continuarão a rezar por mim”.

Eu me senti incluído neste pedido testamentário do Santo Padre e, por conta disso, muito grato também a Deus. Não consegui conter minhas lágrimas na missa conventual, às 7h, do dia 21 de abril, quando o guardião me disse assim: “Você está sabendo da última? Eu lhe perguntei: Como assim? O Papa Francisco morreu hoje”.

Quantas incompreensões, rebeldias e desrespeitos por parte de muitos com relação ao Papa Francisco em seus doze anos de Pontificado! As vozes em vídeos estão documentadas na selva das redes sociais e nos comentários abaixo, e com a diversão do like “gostei”.

Partindo do meu afeto e apreço por esse Sumo Pontífice, tenho algo agora a dizer: Diante do peso de uma espiritualidade intimista e individualista do “salva a tua alma”, do saudosismo do século XVI, o Magistério do Papa Francisco nos ensinou na esteira do Concílio Vaticano II a levar em conta o contrapeso do que disse São João Crisóstomo (347-407) numa de suas homilias: ‘“Você quer honrar o corpo de Cristo? Não permita que ele seja objeto de desprezo em seus membros, isto é, nos pobres, privados de roupas para se cobrirem. Não honrem a Cristo aqui na igreja com panos de seda, enquanto lá fora vocês o negligenciam quando ele sofre com o frio e a nudez. Aquele que disse: Este é o meu Corpo, disse também: Vistes-me com fome e não me destes de comer”’.

Pela exortação de São João Crisóstomo, podemos dizer, em termos de imagem, que o cristão tem que olhar para as coisas do alto, mas fazendo fio terra. Sem isso, ele se “queima”, deixa muito a desejar.

Este é o contrapeso que o Papa Francisco colocou na balança do seu Magistério, porque ele viu que aí estava o equilíbrio missionário e testemunhal do Evangelho querido pelo Espírito Santo. E não podemos dizer o contrário, porque a “fragrância divina” do Verbo encarnado, como nos mostram os Evangelhos, exalou no meio dos vulneráveis, pobres e abandonados: coxos, aleijados, leprosos, crianças, mulheres, cobradores de impostos, endemoniados, enfim, no meio dos pecadores.

Levando em conta esta “fragrância divina”, quem sou eu na qualidade de cristão católico – e pior ainda se forem homens Ordenados – para me opor ao Papa Francisco quando logo no início do seu pontificado desejou que houvesse na Igreja “pastores com cheiro de ovelha”? Será que a “fragrância divina” e “pastores com cheiro de ovelha” não andam juntos?

Por conseguinte, há de considerar que diante de atitudes cristãs “ad intra”, isto é, voltadas para dentro de si apenas, o contrapeso de uma Igreja “ad extra”, isto é, de uma “Igreja em saída” faz parte da balança Magisterial do Papa Francisco. E isso não tem nada que ver com ideologia, com partido, com corrente filosófica, mas tão somente com o amor. De fato, as ideologias, os partidos, as correntes de pensamento não transformam ninguém nem o mundo. Só o amor transforma a pessoa e o mundo. Só o amor revoluciona verdadeiramente o mundo com suas estruturas pecaminosas e, portanto, pode recompor relações humanas feridas. Foi precisamente em nome desse amor na qualidade de virtude teologal que o Papa Francisco olhou para as periferias geográficas e existenciais, olhou para o outro, pensou sempre no outro, quis fazer algo pelo outro, porque o outro lhe foi sempre uma exigência ética e nunca deixará de sê-la também para todos nós independentemente de raça, de cultura, de religião. Todos nós somos esses filhos pródigos. Só o prodígio de Deus com sua fragrância de amor e misericórdia pode nos fazer entender o legado do encontro, da proximidade, da fraternidade, da acolhida, da inclusão deixado pelo Papa Francisco. Quem não faz o esforço por trilhar esse caminho real e sinodal ensinado por Jesus Cristo e insistido pelo Papa Francisco com suas palavras e seus gestos permanecerá sempre na fantasia da fé e no convencimento. Ser convencido é soberba. Isso é pecado.

Como eu disse no início, referente ao Testamento do Papa Francisco, sinto-me muito contente por tê-lo amado e sempre com a esperança de eu ser recompensado por isso também.

E já que manifestei meu amor pelo Papa Francisco, desde já deixo bem claro que vou amar muito também o próximo Papa que o Espírito Santo vai dar de presente para a Igreja no mês de maio. Venha ele de onde vier: da américa, da Ásia, da Europa, da Oceania, da África. Unidade, comunhão e apostolicidade são essenciais à fé cristã.

Papa Francisco, obrigado pelo seu Testamento e pelo seu testemunho! Agora, peço-lhe só uma coisa para encerrar: interceda junto do Deus Uno e Trino por mim, para que eu seja uma luz no meio do povo de Deus!

Frei José Luís Leitão, OFMCap.

São Luís, MA (Coroadinho), 26 de abril de 2025

Autor:
Frei José Luís Leitão, OFMCap
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