Introdução
Foi Paulo Sabatier quem publicou pela primeira vez este Escrito, no ano de 1900. Ele o achara no Códice de Volterra. Deu-lhe o nome de Verba vitae et salutis (Palavras de vida e de salvação) e disse que se tratava de um primeiro esboço do Escrito hoje conhecido como Segunda Carta aos Fiéis (que ainda não tinha sido publicado naquele tempo). Lemmens e Boehmer aceitaram o escrito mas disseram que se tratava de um resumo posterior. Esser conseguiu provar que se tratava realmente de uma primeira versão, mais antiga, da outra e lhe deu esse nome de “Carta aos Fiéis - primeira recensão”, corrigindo o título dado por Sabatier. Essa primeira versão, bem de acordo com o que dizem o Anônimo Perusino (41) e a Legenda dos Três Companheiros (60), é escrita no plural, pelos frades, com São Francisco. É um belíssimo e simples documento que fala dos que fazem e dos que não fazem penitência.
Na segunda edição da obra de Esser, Grau aproveitou estudos feitos por Pazzelli e mostrou que, de fato, não se trata de uma Carta mas de um “louvor” a Deus pelos que fazem penitência: os que chamamos de Irmãos e Irmãs da Penitência. E que o título de Sabatier estava correto...
Primeira recensão da Carta aos Fieis
(Exortação aos irmãos e às irmãs sobre a penitência) Em nome do Senhor!
Dos que fazem penitência
1 Todos os que amam o Senhor com todo o coração, com toda a alma e a mente, com toda a força (cfr. Mc 22,39) e amam seus próximos como a si mesmos (cfr. Mt 22,39),
2 e odeiam seus corpos com os vícios e pecados,
3 e recebem o corpo e o sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo,
4 e fazem frutos dignos de penitência:
5 Oh! como são bem-aventurados e benditos, eles e elas, enquanto fazem essas coisas e nelas perseveram,
6 porque des-cansará sobre eles o espírito do Senhor (cfr. Is 11, 2) e neles fará sua casa e morada (cfr. Jo 14, 23),
7 e são filhos do Pai celeste (cfr. Mt 5,45), cujas obras fazem, e são espo-sos, irmãos e mães de nosso Senhor Jesus Cristo (cfr. Mt. 12, 50).
8 Somos esposos, quando pelo Espírito Santo une-se a alma fiel a nosso Senhor Jesus Cristo.
9 Somos seus irmãos quando fazemos a vontade do Pai que está nos céus (Mt 12, 50).
10 Mães, quando o levamos em nosso coração e em nosso corpo (Cfr. 1Cor 6, 20), pelo amor divino e a consciência pura e sincera; e o damos à luz pela santa operação, que deve iluminar os outros com o exemplo (cfr. Mt 5, 16).
11 Oh! como é glorioso, santo e grande ter nos céus um Pai!
12 Oh! como é santo ter tal esposo: paráclito, belo e admirável!
13 Oh! como é santo e dileto ter tal irmão e filho, agradável, humilde, pacífico, doce, amável e sobre todas as coisas desejável: Nosso Senhor Jesus Cristo! que deu a vida por suas ovelhas (cfr. Jo 10,15) e orou ao Pai dizendo:
14 Pai santo, guarda-os em teu nome (Jo 17, 11), os que me deste no mundo; eram teus e mos deste (Jo 17,6).
15 E as palavras que me deste, lhas dei; e eles as receberam e creram, de verdade, que saí de ti e conheceram que me enviaste (Jo 17,8).
16 Rogo por eles e não pelo mundo (cfr. Jo 17, 9).
17 Bendize-os e santifica-os (Jo 17, 17), e por eles santifico a mim mesmo (Jo 17,19).
18 Não rogo só por eles, mas por aqueles que hão de crer em mim por sua palavra (Jo 17, 20), para que sejam santificados em um (Cfr. Jn 17, 23), como também nós (Jo 17, 11).
19 E quero, Pai, que onde eu estou também eles estejam comigo, para que vejam minha claridade (Jo 17,24) em teu reino (Mt 20,21). Amém.
Dos que não fazem penitência
1 Mas todos aqueles e aquelas que não vivem em penitência,
2 e não recebem o corpo e o sangue de nosso Senhor Jesus Cristo,
3 e cometem vícios e pecados
4 e que andam atrás da concupiscência má e dos maus desejos de sua carne, e não guardam o que prometeram ao Senhor,
5 e servem corporalmente ao mundo com os desejos carnais e com as preocupações do século e com os cuidados desta vida:
6 presos pelo diabo, de quem são filhos e cujas obras fazem (cfr. Jo 8,41),
7 são cegos, porque não vêem a luz verdadeira, nosso Senhor Jesus Cristo.
8 Não têm a sabedoria espiritual, porque não têm o Filho de Deus, que é a verdadeira sabedoria do Pai,
9 dos quais se diz: Sua sabedoria foi devorada (Ps 106, 27); e malditos os que se afastam de seus mandatos (Ps 118, 21).
10 Vêem e conhecem, sabem e fazem o mal e eles mesmos perdem, sabendo, as almas.
11 Vede, cegos, enganados por vossos inimigos: pela carne, o mundo e o diabo; porque para o corpo é doce fazer o pecado e é amargo fazê-lo servir a Deus;
12 porque todos os vícios e pecados saem e procedem do coração dos homens, como diz o Senhor no Evangelho (cfr. Mc 7, 21).
13 E nada tendes neste século nem no futuro.
14 E calculais que possuís por muito tempo as vaidades deste século, mas estais enganados, porque virá o dia e a hora, em que não pensais, não sabeis e ignorais; adoece o corpo, a morte se aproxima e assim se morre com amarga morte.
15 E onde quer, quando quer, como quer que morra o homem em pecado mortal, sem penitência e satisfação, se pode satisfazer e não satisfaz, o diabo arrebata sua alma de seu corpo com tanta angústia e tribulação, que ninguém pode saber senão quem as sofre.
16 E todos os talentos e poder e ciência e sabedoria (2 Par 1, 12), que calculavam ter, deles serão tirados (cfr. Lc 8, 18; Mc, 4, 25).
17 E o deixam aos parentes e amigos e eles tomaram e dividiram sua riqueza e disseram depois: Maldita seja sua alma, porque podia dar-nos e conseguir mais do que conseguiu.
18 Os vermes comem o corpo, e assim perderam corpo e alma neste breve século e irão para o inferno, onde serão atormentados sem fim.
19 A todos a quem chegar esta carta, rogamos, na caridade que é Deus (cfr. 1 Jo 4, 16), que recebam benignamente com a-mor divino estas sobreditas odorosas palavras de nosso Senhor Jesus Cristo.
20 E os que não sabem ler, façam com que as leiam muitas vezes;
21 e as guardem consigo com santa operação até o fim, porque são espírito e vida (Jo 6, 64).
22 E os que não fizerem isto, terão que dar conta no dia do juízo (cfr. Mt 12, 30), diante do tribunal de nosso Senhor Jesus Cristo (cfr. Rm 14, 10).