Crônica de de Frei Tomás de Eccleston - 53-112

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A divisão da Inglaterra em administrações

53. Um bom tempo depois do estabelecimento dos frades na Inglaterra, pediram ao ministro geral Frei Elias que a província inglesa fosse dividida em duas: uma da Escócia e outra da Inglaterra, como antes. Porque ele queria, como diziam, que como a ordem dos frades pregadores tinha doze priores provinciais em todo o mundo em lugar dos doze apóstolos, tivesse ele sob seu governo setenta e dois ministros, no lugar dos setenta e dois discípulos.

Foi feito ministro da Escócia Frei Henrique de Reresby, mas morreu antes que lhe chegasse a obediência. Sucedeu-lhe, então, Frei João de Kethene, guardião de Londres, que mandou agregar todos os Lugares para lá de York. Depois recebeu muitas pessoas honestas e úteis à Ordem. Nutrindo especial zelo pelo oficio divino, mostrou-se modelo de devoção. Recebeu nosso venerável pai Frei Alberto no Lugar de Leicester com a devida reverência e implorou-lhe humildemente que expusesse a regra aos irmãos. Depois de ter por muitos anos dirigido louvavelmente a província da Escócia, foi nomeado pelo ministro geral Frei Alberto como ministro da Irlanda, depois que a província foi reintegrada à Inglaterra.

54. Adenda: No tempo de Frei João, Frei Elias mandou que os próprios frades lavassem seus calções; por isso os irmãos da administração da Inglaterra lavaram-nos como fora mandado; os irmãos da administração da Escócia, porém, aguardaram a chegada do seu rescrito.

55. Ele esteve também, é bom lembrar, no Capítulo Geral de Gênova, juntamente com Frei Gregório de Bosellis, constantemente ao lado de Frei Guilherme de Notthingham, de feliz memória, ministro da Inglaterra. Aí, quase contra todo o Capítulo Geral, ganharam de maneira feliz a causa para derrubar completamente o privilégio concedido pelo senhor papa de receber dinheiro por meio de procuradores e suspender a interpretação da regra dada pelo senhor Inocêncio nos pontos em que era mais aberta do que a gregoriana(19).

56. Ele também defendeu diante de todos os definidores do Capítulo geral a reconciliação de Frei Elias, e conseguiu que este fosse admoestado através dos frades para não adiar a volta à obediência da Igreja e da Ordem (20).

Além disso, era tão zeloso na promoção dos estudos que mandou comprar em Paris uma bíblia totalmente comentada e levá-la para a Irlanda. Finalmente, tinha tanto cuidado de consolar os frades que muitos desolados de outras províncias se refugiavam junto a ele e com ele pareciam fazer progressos. Assim, depois de ter sido ministro por cerca de vinte anos, foi liberado no Capítulo de Metz, no qual se liberava também Frei Guilherme, ministro da Inglaterra.

57. Adenda: Na exoneração de Frei Elias, foi determinado que só houvesse trinta e duas províncias na Ordem: dezesseis para lá e dezesseis para cá dos montes, porque, como a eleição do ministro geral compete somente aos ministros provinciais e aos custódios, se houvesse tantos votos na eleição e nas deliberações mal daria para resolver algo que requeresse o consenso de tantas pessoas, pois multidão causa confusão.

58. Crescendo dia a dia o número dos frades, as casas e terrenos que haviam sido suficientes para poucos não bastavam para um grande número. Além disso, pela providência de Deus, com freqüência entravam pessoas das quais, parecia, era preciso cuidar com mais honra. Também em alguns Lugares a simplicidade dos irmãos estava alojada de maneira tão impensada que não convinha que os terrenos fossem ampliados, mas que as casas fossem totalmente demolidas. Por isso, aconteceu que, ainda durante a vida de Frei Agnelo, de feliz memória, fora feita muita ampliação, tanto nas casas quanto nos Lugares. Mas ele era tão zeloso pela pobreza que mal permitia que os terrenos fossem ampliados e se construíssem casas, a não ser por inadiável necessidade. Isso ficou muito evidente na enfermaria de Oxford que ele mandara construir tão humilde que a altura das paredes não excedia muito a altura de um homem e até o tempo de Frei Alberto essa casa não tinha hospedaria. Igualmente mandou que fosse reforçado o dormitório de Londres com paredes de pedra, depois de ter demolido as de barro, mas o teto ficou como era. Sob Frei Alberto, foi mudado o Lugar de Northampton, e igualmente o de Worcester e o de Hereford.

59. Também sob Frei Haymon foi feita ampliação dos terrenos em alguns Lugares; pois ele dizia preferir que os irmãos tivessem amplos terrenos e os cultivassem para ter os mantimentos da casa a que os mendigassem dos outros. Disse isso por ocasião da ampliação do terreno de Gloucester, que antes, por deliberação de Frei Agnelo, os frades tinham reduzido em grande parte e depois, com grande dificuldade, recuperaram do senhor Tomás de Berkeley, graças à habilidosa dedicação de sua esposa.

60. Sob Frei Guilherme, foi mudado o Lugar de York, e igualmente o de Bristol, bem como o de Bridgewater; mas o Lugar de Grimsby e também o de Oxford foram suficientemente ampliados. E quando um frade, por muita amizade, pois alguns frades até diziam que ele era a sua alma – pois também o ministro dignou-se escrever-lhe com inestimável afeto de próprio punho quando estava desolado – lhe disse que o acusaria junto ao ministro geral de que o Lugar de Londres não era fechado, respondeu com o maior zelo: “E eu responderei ao geral que não entrei na Ordem para construir muros”.

E assim, com o mesmo zelo, mandou que fosse arrumado o teto da igreja de Londres e raspadas as molduras do claustro. Disse também uma vez a esse frade, seu amigo, que era preciso construir edifícios um pouco maiores para que os frades futuros não os fizessem grandes demais.

61. Adenda: Frei Roberto de Slapton disse-me que, enquanto os irmãos estavam num Lugar alugado antes de terem um terreno, pareceu ao irmão guardião que São Francisco veio ao Lugar; os frades foram ao seu encontro, levaram-no ao terraço, e ele se sentou, olhando longamente ao redor, em silêncio. Com os frades admirados, o guardião disse: “Pai, o que pensas?”. E lhe disse: “Olha a casa ao redor”; e ele olhou e a casa parecia toda de varas e rebocada com barro e estrume. E disse aos frades: “Assim deveriam ser as casas dos frades menores”. E o guardião tomou água, lavou-lhe os pés e beijou-lhe os estigmas nos pés. Creio que isso aconteceu com o próprio Frei Roberto. Também vi um pregador famoso dizendo publicamente que, pela preocupação com as casas que devia construir em um Lugar, perdera o gosto de pregar e a devoção que costumava ter.

62 Também Frei João, visitador da Ordem dos Frades Pregadores na Inglaterra, disse a respeito de Frei Guilherme de Abingdon que, antes de construir as casas de Gloucester, teve a incomparável graça de pregar, e que nunca tal e tão agradável pregador deveria ter-se ocupado com construções, porque – como dizia o dito Frei João – tornou-se  tão vil pela preocupação de pedir que o Rei da Inglaterra lhe dizia: “Frei Guilherme, costumavas falar tão espiritualmente; agora tudo o que falas é: Dá, dá, dá”. E em outra ocasião, ao portar-se junto a ele com lisonjas, pedindo dele alguma coisa, o mesmo príncipe chamou-o de serpente.

63. O senhor abade de Chertsey disse-me que, quando um frade da ordem dos pregadores, muito amigo seu, lhe pediu lenha, deu-lhe uma acha. Quando disse que lhe parecia incômodo ir até lá por uma só acha, deu-lhe outra. Quando disse que Deus era trino e por isso deveria dar-lhe três achas, o abade respondeu-lhe: “Por Deus, que é um, agora terás somente uma”.

64. Quando Frei Henrique de Burford recebeu o hábito em Paris, só havia no mesmo convento uns trinta frades. Nessa ocasião estavam construindo um Lugar que se chama Valvert, onde fizeram uma casa comprida e alta, que a muitos frades parecia contra o estado de pobreza da Ordem. Por isso, alguns frades, e principalmente Frei Agnelo, suplicavam a São Francisco que a destruísse. E eis que, quando os frades estavam para entrar, por disposição divina, ninguém ficou dentro, porque todo o teto, com as paredes, se desmoronou até o piso. Aí foram encontrados estes versos escritos: “A graça divina ensinou, com a presente ruína/, que o homem deve estar contente com uma casa menor”. E assim eles abandonaram o terreno.

A promoção dos Lentes

65. Tendo ampliado o Lugar onde florescia o principal studium na Inglaterra e onde todos os estudantes costumavam reunir-se, Frei Agnelo mandou construir uma escola bem digna no Lugar dos frades e pediu ao mestre Roberto Grosseteste, de santa memória, que aí lecionasse aos frades(21).

Com ele, progrediram incalculavelmente em pouco tempo, tanto na teologia quanto nas sutis questões da moral próprias para a pregação. Quando ele foi, por divina providência, transferido da cátedra magistral para a pontifical, aí lecionou aos frades o mestre Pedro, depois promovido a bispo na Escócia. Sucedeu-lhe o mestre Rogério de Weseam, que foi nomeado primeiro decano da igreja e depois bispo de Coventry. Igualmente, o mestre Tomás de Gales, depois de ter lecionado louvavelmente aos frades nesse lugar, foi feito bispo de São Davi, em Gales. Estes, portanto, sempre em tudo favoráveis aos frades, muito promoveram os atos e a fama deles por diversos lugares. Por isso, a fama dos frades da Inglaterra e o progresso no estudo ficaram tão conhecidos também nas outras províncias que o ministro geral Frei Elias mandou chamar Frei Felipe de Gales e Frei Adão de York, que lecionaram em Lyon.

66. Quando chegou, Frei Alberto, também constituiu Frei Vicente de Coventry lente em Londres, e seu irmão, Frei Henrique, lente em Canterbury. E assim, pouco a pouco, nos diversos Lugares foram colocados lentes: Frei Guilherme de Leicester em Hereford; Frei Gregório de Bosellis, em Leicester; Frei Gilberto de Cranford, em Bristol; Frei João de Weston, em Cambridge; Frei Adão de Marsh, em Oxford. E o dom da sabedoria se derramou tanto na província da Inglaterra que, antes da dispensa de Frei Guilherme de Nottingham, havia na Inglaterra trinta lentes que “disputavam” solenemente e três ou quatro que lecionavam sem “disputa”(22). Pois destinara às universidades estudantes dos diversos Lugares para sucederem aos professores falecidos ou transferidos. Deixando outras coisas, vamos falar sobre a sucessão dos lentes nas universidades.

67. Alguns começam como mestres, outros lecionam como bacharéis. Em Oxford, o primeiro a lecionar foi Frei Adão de Marsh. O segundo, Frei Rodolfo de Colebrugge, que em Paris, onde antes fora reitor de maneira louvável, pois entrou como reitor em teologia, foi destinado pelo ministro geral para ser reitor em Oxford, onde também lecionou, quando noviço. O terceiro foi Frei Eustáquio de Normanville, que antes fora muito nobre e rico, mestre das Artes e do Direito e Chanceler de Oxford.

68. Frei Pedro, ministro da Inglaterra, disse que Frei Eustáquio de Normanville, ao ingressar, foi de maior edificação do que os outros, porque foi nobre e rico, louvado reitor em Artes e Direito, Chanceler de Oxford e pronto para começar na Teologia.

69. O quarto foi Frei Tomás de York. O quinto foi Frei Ricardo Rufo de Cornualha que ingressou em Paris, no tempo em que Frei Elias perturbava toda a Ordem, e fez sua profissão para a Inglaterra com constância e devoção, no tempo em que ainda estava pendente essa apelação. Depois, lecionou como “cursor” as Sentenças em Paris onde foi considerado grande e admirável filósofo.

[Esse Ricardo, quando veio para a Inglaterra, contou no capítulo de Oxford que, em Paris, um frade em êxtase pareceu ver que Frei Egidio, leigo, mas contemplativo, subira ao púlpito e comentava os sete pedidos do Pai-nosso, e todos os ouvintes eram só os lentes na Ordem.

Mas São Francisco entrou. No começo, ele ficou quieto, e depois exclamou: “Que vergonha para vós que este leigo supere vossos méritos até ao alto do céu. E disse: como a ciência incha, mas a caridade edifica, muitos frades clérigos venerados na terra são um nada no reino eterno de Deus”].

70. Adenda: Um lente egrégio(23), que estudou comigo em Oxford, quando o mestre lecionava ou disputava, sempre, nas aulas, costumava prestar atenção em outras coisas, como, por exemplo, na compilação de originais. Mas, quando ele mesmo se tornou lente, seus ouvintes ficavam tão desatentos que ele dizia que estava disposto a lecionar ou a fechar de bom grado cada dia o seu livro e ir embora. E compungido disse: “Pelo justo julgamento de Deus, ninguém quer me ouvir, porque eu nunca quis ouvir doutor algum”. Além disso, como se comunicava mui assiduamente com amigos seculares, e por sua amizade com eles, dava menos atenção aos frades do que era costume, serviu de exemplo para os outros de que as palavras da sabedoria só se aprendem no silêncio e na quietude, e também de que só a mente tranquila pode perscrutar os mandamentos de Deus, como diz um santo.

Mas depois, caindo em si, dedicou-se à quietude e progrediu de maneira tão excelente que o senhor de Lincoln dizia que não ensinaria tão bem como ele. Por isso, crescendo depois a fama de sua probidade, chamado para a região da Lombardia pelo ministro geral, foi considerado grande na própria cúria do papa. No fim, apareceu-lhe a Mãe de Deus, de quem sempre fora devoto e, agindo na hora da morte afugentou os espíritos malignos, e ele mereceu ir feliz para as penas purificadoras, como ele mesmo revelou depois a um seu amigo. Disse que estava no purgatório e que sofria gravemente nos pés, porque costumava muito freqüentemente visitar uma religiosa matrona para consolá-la, quando devia cuidar de suas aulas e de outras ocupações mais necessárias. Também pediu que mandasse celebrar missas por sua alma. O amigo fez isso continuamente por dois anos e ofereceu muitos outros sufrágios(24).

80. Então, Frei Haymon levantou-se, parecendo tímido e trêmulo. Frei Elias sentou-se, e parecia inabalável em tudo e impávido. Frei Haymon começou comentando brevemente suas palavras como as de um pai digno de veneração, e concluiu que, mesmo que os frades tivessem dito que queriam que comesse ouro, não haviam dito que queriam que tivesse um tesouro. Além disso, mesmo que tivessem dito que queriam que ele tivesse um cavalo, não haviam dito que queriam que tivesse um palafrém ou um ginete. E logo Frei Elias, perdendo a paciência, disse abertamente que ele estava mentindo; e seus partidários também começaram a insultar e a vociferar. E os adversários faziam o mesmo contra eles.

Então, o papa, perturbado, mandou que se calassem, dizendo: “Isso não é modo de religiosos!”. Depois, sentado por muito tempo em silêncio e meditação, deixou todos preocupados. Dom Reinaldo, protetor da Ordem, sugeriu abertamente a Frei Elias que renunciasse nas mãos do papa. Ele respondeu publicamente que não queria. Então, o papa, recomendando antes de tudo a pessoa dele e mencionando a amizade que ele tivera com São Francisco, concluiu que pensava que seu ministério tinha agradado aos frades. Mas, como não agradou, e isso estava provado, decretou que devia ser deposto. E logo o exonerou do ministério geral. Houve tão imenso e indizível júbilo que aqueles que mereceram estar presentes disseram que nunca tinham visto nada igual.

81. Então o papa entrou sozinho em uma cela e chamou os ministros e custódios para a eleição. Antes de escreverem os votos, ele os ouviu um por um. Quando foi canonicamente eleito Frei Alberto de Pisa, ministro da Inglaterra, Frei Arnulfo, penitenciário, o que mais promovera todo o negócio, anunciou em voz alta a eleição e iniciou o Te Deum laudamus. E porque Frei Elias, como se dizia, nunca havia professado a Regra Bulada, e por isso estava convencido de que podia receber dinheiro, logo providenciaram para que ele a professasse e na mesma forma todo o Capítulo e, conseqüentemente, toda a Ordem. Assim foi feito. Então, tendo sido celebrada a missa pelo ministro geral, o mesmo disse aos frades que não eram do Capítulo: “Ouvistes a primeira missa jamais celebrada nesta Ordem pelo ministro geral. Ide agora com a bênção de Jesus Cristo para os vossos Lugares”.

82. No mesmo Capítulo, Frei Haymon foi nomeado ministro de toda a Inglaterra, e Frei João de Kethene, que fora ministro da Escócia, nomeado ministro da Irlanda.

83. Depois disso, Frei Elias, tendo escolhido para morar o Lugar de Cortona, entrou nos mosteiros das Damas Pobres sem licença, contra a proibição universal do ministro geral; por isso, parecia ter incorrido na sentença lavrada pelo papa. Mas Frei Alberto ordenou-lhe que viesse para obter a absolvição, ou pelo menos que viesse ao seu encontro em algum lugar intermediário. Como não se dignou fazê-lo, a notícia chegou ao papa. Quando percebeu que o papa queria que ele obedecesse ao ministro geral, como qualquer outro frade, não suportando a humilhação, porque não aprendera a obedecer, foi para a região de Arezzo (29). Por isso, foi publicamente excomungado pelo papa, não sem merecimento.

84. Frei Alberto, portando-se de modo louvável no ministério geral, corrigindo os excessos de seu predecessor, manteve-se para lá dos Alpes, onde fora maior a deformação da Ordem. Morreu felizmente em Roma, elogiando os ingleses acima de todas as nações no zelo por sua Ordem.

85. Sucedeu-lhe o inglês Frei Haymon que tratou de promover com empenho o que tinha começado. Sob ele foi celebrado o primeiro e último Capítulo geral dos definidores, que nunca houve na Ordem por causa da insolência deles. Eles quiseram de todos os modos mandar embora de lá, com o geral, todos os ministros que estavam no Capítulo; o que foi feito. Por isso, a resolução tomada diante do papa na exoneração de Frei Elias a respeito deste Capítulo dos súditos e também a respeito dos custódios e guardiães a serem eleitos canonicamente foi abolida no Capítulo geral seguinte por causa da insolência dos próprios súditos. Pois alguns frades queriam que os custódios fossem totalmente extintos da Ordem, dizendo que o ofício deles era supérfluo. Na metade do inverno, quando estava para cá dos Alpes, Frei Haymon foi citado pelo protetor da Ordem e por outros cardeais. Respondeu muito bem diante deles ao que lhe fora objetado e granjeou para si a maior simpatia.

86. Em seus dias, chegou um decreto do Capítulo para que fossem escolhidos frades em todas as províncias da Ordem para anotarem o que era duvidoso na Regra e o mandarem ao ministro geral. Para isso foram escolhidos na Inglaterra Frei Adão de Marsh, Frei Pedro, custódio de Oxford, Frei Henrique de Burford e alguns outros. Na mesma noite, São Francisco apareceu a Frei João de Bannister e mostrou-lhe um poço profundo. Frei João disse: “Pai, os padres querem explicar a Regra; é melhor que tu expliques a Regra”. O santo respondeu: “Filho, vá aos irmãos leigos, e eles te explicarão a tua Regra”. Por isso, tendo anotado alguns artigos, os frades os enviaram ao geral em cédula sem selo, suplicando pela aspersão do sangue de Jesus Cristo que permitisse que a Regra permanecesse como foi transmitida por São Francisco, ditada pelo Espírito Santo. Esse decreto agradou muito, tanto ao protetor da Ordem quanto aos frades do ultramar; e confirmou o testemunho que Frei Alberto dera a respeito dos ingleses. Frei Haymon morreu em Anagni; o papa Inocêncio IV dignou-se visitá-lo quando ele estava de cama.

87. Adenda: Sobre frades que não queriam voltar para o convento depois de uma doença antes de estarem bastante fortes, com receio de não poder voltar à convalescença, Frei Haymon disse que eram como o menino a quem quiseram ensinar as letras contra a sua vontade: lia bem o A, mas mesmo sabendo ler tão bem o B não queria, porque se lesse bem o B o professor mandaria ler o C, e daí em diante.

Disse também que, quando ainda era secular, era tão delicado que não podia viver sem os mais variados recursos das vestes e dos calçados, mas depois se tornou mais forte sem essas coisas.

Quando Frei Haymon estava voltando do capítulo geral em que o fizeram ministro provincial, temendo por sua frágil constituição, pensou que, se pudesse chegar para cá dos Alpes, daí para frente não ia ter medo. Mas aconteceu que foi mais forte onde mais temera, e mais fraco na França.

88. Sucedeu-lhe Frei Crescêncio (30), médico famoso, ministro de Verona, com um zelo inflamado pela caridade, modelado pela ciência e confirmado pela constância. Teve tanta oposição dos frades de sua província que, na noite do Capítulo geral em que foi eleito, depois de uma denúncia que tinha feito aos zelantes (31) da Ordem sobre a rebelião de seus coirmãos, um frade teve uma visão em que ele estava com a cabeça raspada, com uma barba branca até o cordão, e ouviu uma voz do céu sobre ele nestes termos: “Este é Mardoqueu”. Quando Frei Rodolfo de Reims ouviu contar essa visão, disse imediatamente: “É certo que hoje ele vai ser eleito geral”. Depois que exerceu o ministério por algum tempo com fidelidade e prudência, pediu para ser exonerado. Depois foi feito bispo da cidade de onde era oriundo.

89. Adenda: O inglês Frei Rodolfo de Reims veio para a Inglaterra depois de ter trabalhado muito e, dedicando-se por longo tempo à contemplação, morreu de maneira feliz em Salisbury. Ele contou que São Francisco, caminhando ao vento frio, ficava com medo; mas, depois de recuperar a coragem, subia à montanha, despia-se, voltava-se contra o vento e dizia a si mesmo que, se tivesse uma túnica, seria bom para ele.

90. Sucedeu-lhe Frei João de Parma (32), lente, que lecionava as sentenças como “cursor” em Paris, notável zelador da Ordem. Veio para a Inglaterra no tempo de Frei Guilherme de Nottingham, celebrou o Capítulo provincial em Oxford e convocou de novo à unidade os frades que queriam destacar-se dos outros por opiniões excêntricas. Exaltou a obediência e a honestidade dos ingleses em todas as províncias. Reconciliou os frades de Paris, protestando pessoalmente na universidade a simplicidade da profissão, depois de ter revogado a apelação que eles haviam feito.

Foi ele quem ordenou que o Capítulo geral se celebrasse alternadamente para lá e para cá dos Alpes.

Por fim, não podendo suportar por mais tempo o peso do ministério geral, obteve do senhor Papa Alexandre IV poder retirar-se. Dizia o mesmo padre que, como o edifício da Ordem se constrói com duas paredes: os bons costumes e a ciência, os frades levantaram a parede da ciência acima dos céus e do que é celeste a ponto de perguntar se Deus existe. Mas deixaram a parede dos costumes tão baixa que dá para dizer de um frade, como grande louvor: “E um homem seguro”. Parecia que não estavam edificando convenientemente. Queria que os frades se defendessem diante dos prelados e príncipes mais por merecimentos públicos do que por privilégios apostólicos; e que fossem os menores entre todos pela humildade e pela mansidão.

91. Adenda: Frei João de Parma, ministro geral, em pleno Capítulo geral de Gênova, ordenou a Frei Bonício (33), que fora companheiro de São Francisco, que dissesse aos irmãos a verdade sobre os estigmas, porque muitos pelo mundo duvidavam deles (34). E ele respondeu com lágrimas: “Estes olhos pecadores os viram, e estas mãos pecadoras os tocaram”.

92. Mas, também Frei Leão, companheiro de São Francisco, disse a Frei Pedro, ministro da Inglaterra, que a aparição do Serafim a São Francisco aconteceu num arrebatamento de contemplação, e bem mais evidente do que se escreveu na Vida dele; e que, naquele momento, muitas coisas lhe foram reveladas, que nunca comunicou a nenhum vivente. Na verdade, disse a Frei Rufino, seu companheiro, que, quando viu o anjo de longe, ficou com muito medo e que o tratara duramente. E que o anjo disse que sua Ordem duraria até ao fim do mundo, que ninguém de má vontade pode perseverar por muito tempo na Ordem, que ninguém que odeia a Ordem viveria muito, e que ninguém que ama verdadeiramente sua Ordem teria mau fim. E São Francisco ordenou a Frei Rufino que lavasse e ungisse com óleo a pedra sobre a qual estivera o anjo; e ele o fez. Frei Garino de Sedenefeld escreveu estas coisas ditas por Frei Leão (35).

A sucessão dos ministros provinciais

93. O primeiro ministro da Inglaterra, como dissemos, foi Frei Agnelo de Pisa, homem especialmente dotado de natural prudência, notável em toda virtude, ordem e honestidade. Depois de uma missão que concluiu louvavelmente na Cúria Romana, com Frei Pedro de Tewkesbury, então guardião de Londres, e com Frades Pregadores em favor dos prelados da Inglaterra, adoeceu em Oxford de desinteira, por causa do frio, como se dizia, e da fadiga que suportara, percorrendo a Inglaterra, para restabelecer a paz entre o senhor rei e o seu governador da região de Gales. Depois que a diarréia foi sustada por remédios, assaltaram-no uma colite intestinal e uma dor do lado, de modo que mal podia deixar de gritar.

Antes de morrer, clamou por três dias consecutivos, quase continuamente: “Vem, Jesus dulcíssimo!”. Quando recebeu os devidos sacramentos da Igreja, pediram-lhe que desse um conselho sobre o sucessor: aconselhou que mandassem Frei Hugo de Wellys a Frei Elias e que os frades pedissem que lhes fosse concedido como ministro Frei Alberto de Pisa ou Frei Haymon ou Frei Rodolfo de Reims. No que lhe competia, constituiu Frei Pedro de Tewkesbury como vigário. Assim, depois de ter pedido orações a cada um dos frades, no fim da encomendação, que ele próprio rezou com o convento, expirou de maneira feliz. A seu companheiro, Frei Walter de Madeley, parecia que no coro jazia um cadáver, que parecia deposto recentemente da cruz, pois, como Jesus Cristo crucificado, tinha as cinco chagas a sangrar. Crendo que era o próprio doce Jesus Cristo, aproximou-se e viu que era Frei Agnelo.

Depois de muitos anos, os irmãos precisaram remover seu corpo, quando destruíram a capela na qual fora sepultado diante do altar e, no coro, encontraram, junto da fossa, a urna de chumbo em que jazia cheia de óleo puríssimo, com o corpo incorrupto emanando um suave odor junto com as roupas.

94. Adenda: É digno de memória que o venerável varão, o mestre Serlo, decano de Exeter, aconselhou Frei Agnelo a raramente comer fora do convento. Aconteceu uma vez que um guardião, no mesmo dia em que pregara ao povo, depois do almoço, ao brincar com palavras com um monge diante de um secular, que tinha almoçado com os frades, o secular disse baixinho a um frade, que era seu secretário, que isso não era conveniente a um prelado e pregador. E o próprio guardião me disse que preferia ter sido traspassado por uma lança no meio das costelas a ter dado tal exemplo. Os frades zelavam muito pela reputação da Ordem, especialmente Frei Agnelo, que não poupou sequer o secretário do rei, retirando-o da corte e não permitiu que desse ou aceitasse qualquer coisa.

95. Adenda: Frei Agnelo, visto que tinha sido ministro da Inglaterra por muito tempo na ordem do diaconato, não quis ser promovido a sacerdote antes que o Capítulo geral se encarregasse, por meio do Capítulo provincial, de obrigá-lo a isso. Mas era tão devoto no oficio divino que não só na missa, mas também no coro, e também quando estava viajando, parecia chorar continuamente, mas de modo que não podia ser percebido por algum ruído, gemido ou alteração do rosto. Também rezava o oficio de pé e repreendeu asperamente um irmão que, depois da sangria, rezava as Horas sentado. Quando sentiu que a morte estava iminente, disse a Frei Pedro de Tewkesbury: “Conheces toda a minha vida”; e quando Frei Pedro disse que ele nunca lhe havia feito uma confissão geral, bateu na cabeça, começou a chorar alto e imediatamente lhe confessou com admirável contrição toda a sua vida. Depois, tendo convocado os irmãos, absolveu-os e, quando por sua ordem começaram a encomendação, fechou ele mesmo os olhos e colocou as mãos sobre o peito em forma de cruz.

96. Quando Frei Elias recebeu a notícia da morte de Frei Agnelo, mandou imediatamente que fosse destruído o selo provincial, em cuja impressão havia um cordeiro com a cruz, indignando-se porque os frades da Inglaterra tinham pedido que lhes fosse dado como ministro algum dos que foram indicados. Por isso, demorou quase um ano para lhes mandar um ministro.

Finalmente, chamando de volta um que já havia enviado, ordenou a Frei Alberto de Pisa, que fora ministro da Hungria, da Alemanha, de Bolonha, da Marca de Ancona, de Treviso e da Toscana, que partisse para a Inglaterra e aí servisse aos frades como ministro. Ele, então, chegou à Inglaterra na festa de Santa Luzia; e na festa da Purificação celebrou em Oxford o Capítulo provincial e pregou sobre este tema:“Olhai a rocha de que fostes talhados e a caverna profunda de onde vos tiraram” (Is 51,1).

Então, fazendo dos frades tudo que queria, pôde experimentar de vários modos a humildade e a mansidão, a simplicidade e o zelo, a caridade e a paciência dos frades da Inglaterra. Por isso, embora tivesse dito publicamente aos frades que o teriam até ao fim tal qual se lhes mostrara naquele Capítulo, a seguir, dia após dia, oferecendo em sacrifício mais sabiamente que de costume o sal evangélico, transformou-se completamente. De fato, mostrou depois tanta estima pelos frades da Inglaterra que a eles se entregou com todo o afeto da alma e os uniu a si numa inefável aliança; na verdade, encontrou-os conformes à sua vontade em todo propósito de perfeição e preparados para irem com ele ao cárcere e ao exílio pela reforma da Ordem.

97. Estabeleceu que na casa dos hóspedes o silêncio fosse sempre mantido à mesa, menos com os pregadores e com os frades de outras províncias. Também quis também que os frades colocassem túnicas velhas sobre as novas, por humildade e para que durassem mais. Destruiu o claustro de pedra de Southampton, embora com grande dificuldade, porque as pessoas da aldeia se opuseram; e restabeleceu com veemência a carta ou acordo que houve entre os monges de Reading e os frades: que não poderiam por sua vontade expulsá-los, e prometeu-lhes que haveria de remover os frades se eles quisessem. [Quanto à capela do Lugar, como não podia derrubá-la por causa do senhor rei, que a construíra, desejou que fosse destruída pelo céu]. Colocou frades em Chester e em Winchester, mas com grande dificuldade.

98. E recebeu do senhor Papa Gregório a prescrição de que os frades pregadores não impedissem de entrar na Ordem ninguém que quisesse, e que somente recebessem à profissão os seus irmãos noviços depois de concluído o ano de provação. Pois eles costumavam professar no mesmo dia do ingresso se quisessem, como fez Frei Roberto Bacon, de feliz memória.

Eles, muito perturbados, pediram ao senhor Papa Inocêncio IV que nenhum frade menor recebesse os que estavam comprometidos com eles e, se o fizesse, fosse excomungado de fato; e concordaram igualmente com relação aos nossos. Ligaram-nos de tantos modos e publicaram tanto esse privilégio que dificilmente permitiam que alguém saísse.

Mas essa tribulação não durou muito. Pois Frei Guilherme de Nottingham, de feliz memória, e Frei Pedro de Tewkesbury mostraram ao senhor papa o que o seu predecessor estatuíra; e ele, dizendo-se enganado, embora fizesse isto com incômoda demora, concedeu-lhes a revogação.

99. Uma vez, Frei Alberto disse que devemos amar muito os frades pregadores, porque ajudaram nossa ordem em muitas coisas e ocasionalmente nos mostraram como nos precaver de perigos futuros.

100. Frei Alberto dizia que principalmente três coisas elevaram a Ordem: a nudez dos pés, a vileza das vestes e o desprezo do dinheiro.

101. Frei Walter de Reygate dizia que fora revelado a um frade da província de São Francisco que os demônios todo ano celebram um concílio contra a Ordem e tinham encontrado três caminhos: a familiaridade das mulheres, a acolhida de pessoas inúteis e o manuseio de dinheiro.

102. O ministro Frei Alberto costumava dizer a seu companheiro, Frei Ognibene, quando ia ver seus amigos espirituais: “Come, come, pois agora podemos fazer isso com segurança”. E sempre foi precavido com todos os seculares, quanto pôde.

103. Naqueles dias, aconteceu que dois frades muito famosos chegaram à casa de um proprietário de terras, que os recebeu com honra e os serviu com fartura. Quando estavam sentados para o almoço, apareceu o reitor da igreja, censurando-os por não terem ido à casa dele; e como insistisse muito para que eles comessem as carnes servidas, sem conseguir moderá-los, disse irado: “Comei, comei; pois o frio mata vossos corpos, e a gula mata nossas almas”; e, levantando-se, foi embora.

104. No oficio divino, ele se mantinha sempre muito devoto e, com os olhos fechados, evitava a divagação da mente. Sempre risonho e agradável na companhia dos frades, atraía a si o afeto de todos.

Uma vez, quando houve sangria no convento, ele propôs aos companheiros esta parábola, especialmente por causa de um noviço que estava presente, demasiado sábio aos próprios olhos e que ousava intrometer-se a respeito com coisas impertinentes. Disse que um camponês, ao ouvir que no Paraíso havia tanta tranqüilidade e tantas delícias, partiu para procurar onde era e ver se havia um modo de entrar lá. Quando chegou à porta, encontrou São Pedro e pediu para entrar; quando Pedro quis saber dele se poderia e se estaria disposto a guardar as leis do Paraíso, ele disse que sim, contanto que se dignasse dizer o que era. Então Pedro disse que bastava ficar em silêncio. Como concordou livremente, foi introduzido; e andando pelo Paraíso, viu alguém arando com dois bois, um magro e um gordo: deixava o gordo andar como queria e sempre aguilhoava o magro.

Foi lá e o recriminou. Na mesma hora São Pedro apareceu e queria expulsá-lo. Mas perdoou aquela vez e mandou tomar cuidado. Partiu logo dali e viu um homem carregando uma viga comprida e queria entrar numa casa mas sempre virava a viga transversalmente à porta. Foi lá e o ensinou a enfiar primeiro uma ponta da viga. Na mesma hora São Pedro apareceu e queria expulsá-lo de qualquer jeito. Mas perdoou-o também esta vez. Pela terceira vez, saiu dali e viu um homem que cortava lenha no bosque: ele sempre poupava os troncos velhos e árvores tortas e derrubava e cortava as retas, as verdes e as mais bonitas. Foi lá e o censurou. Logo apareceu São Pedro, e o expulsou. Ele queria que os súditos fossem reverentes com seu superior em qualquer lugar: “Deus não permita que a familiaridade gere o desprezo!”

105. Frei Adão de Marsh contou que quando um menino muito delicado adoeceu e o pai lhe pediu que comesse por seu amor, porque era seu filho mais dileto, ele respondeu que não era seu filho. Respondeu do mesmo jeito à mãe, quando também rogou insistentemente. Quando lhe perguntou de quem era filho, se não era seu, ele respondeu com indignação e desaforo: “Sou filho de mim mesmo”. Isso acontece com os teimosos e cheios de caprichos.

106. Adenda: Na conversação anterior, Frei Alberto contou uma parábola contra a presunção dos jovens, dizendo que um touro andava cada dia pelos prados e campos por onde queria. Um dia, por volta da hora Prima ou Terça, aproximando-se do arado e vendo que os bois mais velhos andavam devagar e que tinham arado pouco, criticou-os e disse que teria feito tudo num instante. Pediram que os ajudasse; quando ele foi posto sob o jugo, correu com forte ímpeto até o meio do sulco e, cansado, começou a palpitar e olhou para trás, dizendo: “Como? Ainda não acabei tudo?” Então os velhos, rindo dele, responderam que ainda não. E o touro disse que não podia ir adiante. E eles lhe disseram que por isso mesmo eles andavam mais moderadamente, porque deviam trabalhar continuamente e não só por certo tempo.

107. [Frei Alberto esteve em Oxford durante a pregação de um frade moço no Capítulo; e porque ele estava condenando com audácia o luxo dos edifícios e a abundância de alimentos, acusou-o de vaidoso].

108. Obrigou Frei Eustáquio de Merc a comer peixes contra o costume, dizendo que a Ordem perdeu muitas pessoas boas por falta de discrição. E disse que quando esteve morando com São Francisco numa hospedaria, o santo o obrigou a duplicar cada dia o que costumava comer.

Era também tão generoso que repreendeu severamente um guardião e o ecônomo porque não tinham provido mais abundantemente os frades depois do trabalho que tiveram em uma solenidade. Tinha tanta piedade e compaixão que dava a um frade de saúde fraca licença para ir à sua terra natal e percorrer, se quisesse, toda a custódia de Lugar em Lugar; e ele mesmo pagava se os frades estivessem muito sobrecarregados. Depois de ter dirigido nobremente a Inglaterra por dois anos e meio, viajou com vários frades escolhidos contra Frei Elias. Depois ter sido ministro geral, morreu de maneira feliz em Roma, entre os ingleses.

109. Sucedeu-lhe Frei Haymon que, bondoso e afável, procurou manter os irmãos em toda paz e caridade. Ele vestiu o senhor bispo de Hereford, Rodolfo de Maidstone, depois de uma visão que dele tivera quando era arquidiácono de Chester: que, quando em um sínodo realizava a sessão e organizava o clero, veio um menino, jogou água no rosto dele e, na mesma hora, ele se transformou num menino digno de compaixão. Também foi à cama em que estava Frei Haymon, pediu para se deitar nela e assim o fez. De acordo com isso, teve feliz fim na Ordem. Frei Haymon foi ministro da Inglaterra por um ano e depois foi eleito geral.

110. Quando Frei Haymon era ministro provincial na Inglaterra [disse que uma agitação atravessou a Ordem, quando os irmãos fizeram com que cemitérios e altares em seus terrenos fossem dedicados; porque, de fato, não podem depois ser convertidos para usos profanos]. Ele foi tão grande zelador da pobreza que no Capítulo provincial, no refeitório, se sentava no chão com os últimos, vestido com hábito muito pobre e rasgado.

111. Sucedeu-lhe o seu vigário, Frei Guilherme de Nottinggham, por eleição unânime e por confirmação dos que a tinham pedido. E Frei Guilherme, embora fosse totalmente inexperiente nos ofícios inferiores, como de guardião e de custódio, portou-se de maneira tão notável que seu zelo e honestidade se divulgaram por todas as províncias.

112. Frei Guilherme costumava contar que Santo Estêvão, fundador da Ordem de Grandmont, colocou uma cesta em lugar secreto e seguro; e proibiu a todos que se aproximassem enquanto ele fosse vivo. Então, os frades foram tentados a saber o que havia na cesta; pois o santo também quis que todos, a exemplo dele próprio, a tivessem em grande respeito. Depois de sua morte, eles não conseguiram esperar: romperam-na e só encontraram uma carta que continha algo assim: “Frei Estêvão, fundador da Ordem de Grandmont, saúda seus frades e suplica que se guardem dos seculares. Porque, como vós, enquanto não sabíeis o que havia na cesta, a honrastes, assim também eles vos honrarão”(36).