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A observância da pobreza, a abstinência e o admirável rigor de sua vida; e como, fugindo do louvor dos homens, se julgava o mais vil de todos.

32.

1 O santo confessor de Cristo, Francisco, precavia-se com o maior cuidado para que, ultrapassando as metas da santa e mais alta pobreza, não viesse a cair sempre mais na indigência do que na abundante suficiência e no excesso, mal deixando em casa um pequeno copo.

2 Que diremos dos alimentos delicados, do vinho ou de qualquer outra coisa supérflua, mesmo sem valor, se era muito raro que comesse cozidos, misturando-os com cinza ou água fria, e nem bebesse a água suficiente?

3 Afirmava que seria muito difícil satisfazer as necessidades e não ceder ao prazer.

4 Muitas vezes, quando ia pregar a penitência e era convidado para a refeição nas casas dos seculares, parecia que estava comendo carne, levando a mão à boca;

5 mas era só para observar a palavra do Evangelho, que diz: Comei e bebei do que tiverem (Lc 10,7); comia muito raramente e só um pouquinho, colocando o resto no bolso, com muita discrição.

6 Tendo que dormir, sua cama era a terra nua, colocando em cima apenas sua pequena túnica; e, muitas vezes, dormitava sentado, não deitado, apoiando a cabeça numa tábua ou numa pedra.

7 Também aconteceu que uma vez, por estar doente, teve que comer frango. Depois que recobrou um pouco as forças, ordenou estritamente a um irmão que, com uma corda amarrada no pescoço, o levasse como um ladrão pelo cen­tro da cidade de Assis, proclamando um anúncio:

8 ”Eis o comilão que engordou com carne de galinha, comida secreta­mente sem que o soubésseis”.

9 Compungidos por tão admirável espetáculo, muitos se lamentavam com voz chorosa proclamando que eram mis do que miseráveis, porque diariamente se en­tregavam aos prazeres.

33.

1 Também eram muitas coisas que assim fazia muitas vezes, tanto para se desprezar perfeitamente como para levar os outros a desprezá-lo.

2 Mas, verdadeiro desprezador de si mesmo, com razão era aclamado por todos (Lc 4,15) e, sendo o único a se considerar o mais vil, admiravelmente e com todas as forças repelia o favor dos ho­mens.

3 Quando ouvia que as pessoas o louvavam, não podendo suportar isso, ordenava, sob obediência, que um dos irmãos lhe dirigisse, ao mesmo tempo e com força, palavras injuriosas e, as­sim, falasse a verdade contra as mentiras daqueles que o louva­vam.

4 Quando, contra a vontade, o irmão o chamava de grosseiro e inútil mercenário, o santíssimo homem o aprovava satisfeito

5 e respondia ao que o insultava: “O Senhor te abençoe (cf. Sl 127,5), filho caríssimo, porque falas o que é certo. É isso que o filho de Pedro de Bernardone tem que ouvir!”

6 Também, querendo que todos vissem nele um perfeito vilão, não se envergonhava de confessar seus pecados em público na pregação;

7 e se chegasse a pensar por leviandade algum mal de outro, confessava humildemente a culpa e lhe pedia perdão,

8 Isso demonstra a quem o observar mesmo de leve quanto esse homem evitava palavras de murmuração ou de detração.

9 Que mais? Desejando chegar ao ponto mais alto de toda espécie de perfeição, evitava ao máximo o favor humano;

10 e para possuir interior e conscientemente um vaso de san­tificação (1Ts 4,4), exteriormente apresentou-se como um vaso quebrado (Sl 30,13).