Actus beati Francisci et sociorum eius - Capítulo 61

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Como o bem-aventurado Francisco converteu um nobre.

1 São Francisco, pai venerável e digno de admiração, chegou uma vez à hospedaria de um homem poderoso e nobre. Foi recebido, ele com o companheiro, com tanta de­voção e generosa cortesia que parecia ao dito nobre ter recebido anjos em sua hospedaria. Por causa desta cortesia, São Francisco passou a ter grande devoção para com ele.

2 Pois o dito senhor recebeu São Francisco na entrada da casa com abraço amigo e o beijo da paz; e, depois da entrada, la­vou-lhe os pés, enxugou-os e beijou-os humildemente. Proporcionou-lhes um grande fogo e preparou com abundância uma mesa cheia de todas as iguarias; e, enquanto eles comiam, ele os servia com rosto muito alegre. 3 Tomada a refeição, o se­nhor disse a São Francisco e a seu companheiro: “Pai, eis que me coloco à vossa disposição, a mim e meus bens; e quando necessi­tardes de túnicas e mantos, comprai-os, e eu os pagarei para vós. E vede que estou preparado para socorrer-vos em todas as vossas necessidades, porque o Deus bendito me deu copiosa fartura de tudo que é necessário; e, por isso, por amor dele, gasto-as de boa vontade com os seus pobres e indigentes”.

4 Por esta razão, São Francisco, vendo as coisas que preparara com abundância e ouvindo as que mais profusamente ofe­recera, passou a ter em seu coração tanto amor para com ele que, depois de ter partido, dizia ao companheiro: “Este seria real­mente bom para a nossa companhia, pois é tão grato a Deus, tão amigo para com o próximo, tão generoso para com os pobres e tão alegre e cortês para com os hóspedes! 5 pois, a cortesia, irmão caríssimo, é uma das propriedades de Deus, que administra cor­tesmente o seu sol, a sua chuva e todas as coisas sobre os justos e os injustos. A cortesia ordenada é irmã da caridade, ex­tingue o ódio e conserva o amor. E, porque reconheci neste bom homem tanta virtude divina, de bom grado eu o quereria como companheiro. 6 Por esta razão, eu gostaria que, um dia, voltásse­mos a ele, se por acaso Deus lhe tocar o coração para que ele quei­ra associar-se a nós para servir o Altíssimo. Pediremos ao Senhor Deus que infunda no coração dele esse desejo e lhe dê a graça de levá-lo a cabo!”

7 É certamente admirável que, passados poucos dias, o Se­nhor atendeu ao desejo do coração do bem-aventurado Francisco e não o fraudou no anseio dos seus lábios (cf. Sl 20,3). Pois, após alguns dias, tendo feito antes uma oração, São Francisco dis­se a seu companheiro:, “Vamos, caríssimo, ao senhor cortês, por­que confio no Senhor que ele, com cortesia, se oferecerá como companheiro”. E, tendo tomado o caminho, chegaram até perto da casa do referido homem.

8 E o bem-aventurado Francisco, antes de chegar a ele, disse ao companheiro: “Espera-me, irmão, porque quero primeiro pedir a Deus que torne próspero o nosso caminho (cf. Sl 67,20): que o Cristo, pela virtude de sua santíssima paixão, se digne com sua graciosa virtude conceder-nos a nós, pobres e também enfer­mos, a presa que pensamos arrebatar do mundo”.

9 Pondo-se São Francisco em oração em um lugar onde podia ser visto claramen­te pelo dito senhor cortês e, por disposição de Cristo, estando aquele senhor a olhar aqui e ali, viu São Francisco rezar em devo­tíssima posição diante de Cristo e o Cristo bendito diante do pró­prio Francisco posto muito graciosamente de pé e com grande claridade; e nesta situação luminosa, São Francisco estava por grande espaço elevado da terra por elevação corporal e mental.

10 Logo que o senhor percebeu com clareza tudo isso,pousou sobre ele a mão salutar do Se­nhor (cf. Ez 1,3); saindo corporalmente do seu palácio e despre­zando espiritualmente o mundo, no fervor do espírito correu para o bem-aventurado Francisco; e quando chegou a ele, encon­trou-o de pé no chão e rezando com a maior devoção. Por isso, também o nobre se entregou igualmente à oração; e rezava com insistência para que ele se dig­nasse recebê-lo para fazer penitência e morar com ele.

11 São Francisco, vendo tudo isso e ouvindo que ele pedia justamente o que ele mesmo desejava, e percebendo que tão admirável mudança fora feita pela destra do Senhor (cf. Sl 76,11; 117,16), levantando-se na alegria do espírito, lan­çou-se aos devotos ósculos e abraços dele, rendendo graças e lou­vores ao Altíssimo que agregara tal cavaleiro à sua milícia. 12 No meio disso, o homem dizia: “Pai santo, o que me man­das fazer? Eis que por tua ordem dou tudo aos pobres e, li­bertado do peso das coisas temporais, estou preparado para correr contigo atrás de Cristo!” E assim aconteceu que, pelos méritos e orações de São Francisco, ele abandonou tudo; e tornou-se frade menor de tão perfeita vida e honesta convivência que, por meritó­ria penitência, consumou-a com uma morte louvável.

Para o louvor de Nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.