Actus beati Francisci et sociorum eius - Capítulo 65

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Milagre sobre os estigmas do bem-aventurado Francisco, acontecido em um convento dos Frades Pregadores

1 Quão dignos de veneração foram os maravilhosos estig­mas do santo pai Francisco fica manifesto por um notável milagre mostrado de maneira evidente em um convento dos Fra­des Pregadores. 2 Havia, naquele convento, um frade pregador que odiava tão profundamente o bem-aventurado Francisco que não podia ver em quadro nem ouvir em palavra nem crer no cora­ção que ele tivesse sido marcado com os estigmas sagrados de Cristo. 3 Por isso, quando o frade, um conventual de além-Alpes, estava no referido convento, em cujo refeitó­rio estava pintado São Francisco com os sagrados estigmas, mo­vido pela falta de fé e pelo ódio, aproximou-se às escondidas e com uma faca raspou os sagrados estigmas da pintura do santo pai, de modo a desaparecerem completamente

4 No dia seguinte, porém, quando o mesmo frade se sentou à mesa, olhou para a imagem de São Francisco e viu lá os estigmas nos lugares em que ele raspara, com mais frescor do que os primeiros. 5 E, indignado, pensou que na primeira vez não houvesse raspado completamente; e, observando a hora em que ninguém estava presente, porque quem faz o mal odeia a luz (cf. Jo 3,20), aproximou-se e, pela segunda vez, raspou os estigmas do santo, de tal modo, porém, que não destruiu o cimento por baixo da pintura. 6 No terceiro dia, quando o mesmo frade se sentou à mesa, olhou para a imagem de São Francisco; e eis que viu aqueles sagrados estigmas tão belos e novos como nunca tinham parecido tão recentes. 7 Então o frade, cego pela maldade e incitado pela perfídia, ao segundo pecado acrescentou o terceiro; e disse em seu coração: “Por Deus! Eu destruirei estes estigmas de modo que nunca mais vão aparecer!” 8 E, corno costumava, observando a hora em que ninguém via, mas esquecido de que aos o­lhos de Deus todas as coisas estão nuas e abertas (cf. Hb 4,13), com furioso ímpeto tomou a faca e escavou da pintura os sinais dos estigmas, arrancando a tinta e o cimento.

9 Mas, imediatamente, quando acabou de escavar, come­çou a jorrar sangue vivo dos próprios buracos, e o san­gue, jorrando impetuosamente, começou a ensangüentar o ros­to, as mãos e a túnica do frade. Ele, aterrorizado, caiu como morto. 10 Aquele sangue escorria como um rio dos sagrados estigmas escavados por aquele coitado. Nesse meio tempo, os frades do convento reuniram-se junto dele, que jazia como exânime, e, percebendo sua ma­lícia, muito lamentaram. 11 Vendo, além disso, que aquele sangue fluía continuamente, taparam os buracos com peda­ços de pano e mechas, mas não puderam estancar o fluxo de san­gue. 12 Por isso, temendo que os seculares constatassem esse fato e que por isso eles tivessem que suportar escândalo e vergonha, pensaram em recorrer devotamente a São Francisco. 13 E o prior, com todos do convento, despindo-se diante da imagem de São Francisco e disciplinando-se e suplicando com lágrimas, rogaram ao bem-aventurado Francisco que, com mi­sericórdia, perdoasse a ofensa do frade e se dignasse estan­car o fluxo daquele sangue.

14 E imediatamente, pela humildade deles, a oração foi atendida; o sangue não correu mais, e os estigmas do santo, em sua beleza, permaneceram para ser venerados por todos. E o mencio­nado frade, desde então, se tornou devotíssimo do santo pai; 15 e, como testemunharam os irmãos do lugar do Alverne, aque­le frade se dirigiu ao Monte Alverne por devoção e levou consigo aquela mecha ensangUentada e a deu aos irmãos. 16 Além disso, foi por devoção a Santa Maria dos Anjos e visitou devotamente todos os lugares de São Francisco, com grande re­verência e lágrimas. 17 pois, onde quer que pudesse encontrar algo dos feitos e das coisas de São Francisco, prorrompia em tão de­votas lágrimas que fazia também outros chorarem.

18 Ele mesmo relatou também todos os preditos milagres diante de muitos ir­mãos menores no Alverne e em Assis, estando, porém, ausentes os seus companheiros, talvez para que eles não considerassem como opróbrio de sua Ordem. 19 O dito frade, pelos méritos de São Francisco, tornou-se também tão benévolo para com os irmãos de São Francisco que, assim como antes não podia vê-los, depois, firmado na caridade de Deus, os venerava com afeição de amor fraterno.

Para o louvor e glória de Nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.